Vira a página e escreve o mesmo

 

Nas férias, gosto de esvaziar a mente de dificuldades, incluindo as semânticas. Por isso, escolho livros fáceis, com uma trama que prende logo de início e sem grandes elaborações literárias. O Caso Alaska Sanders, de Joël Dicker, enquadrou-se, assim, na perfeição. No entanto, começo a achar que vou ter de escolher outro autor para me fazer companhia entre mergulhos. A razão para isso é muito bem explicada aqui.

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Adolescência

Que afortunada sou por amar

tanto alguém

 

e saber que posso dar

tanto a alguém.

 

Um homem que merece tanto

que lhe diga «amo-te» tantas

vezes por dia quanto as

que me vierem à mente.

 

A Arte de Mergulhar, de Lili Reinhardt

 

Sou uma inculta da poesia. Não a sei ler, nem apreciar. Por isso, quando na biblioteca folheei um livro que, pelas ilustrações, me chamou a atenção na mesa da poesia, abrindo-o aleatoriamente para encontrar estes versos (é assim que se diz?), achei que me tocava no coração e trouxe-o para ir lendo devagar. Descobri outros versos (é assim que se diz?) que me tocavam o coração e resolvi que estava na hora de explorar o mundo da poesia. Quem sabe encontro nela as palavras que me têm faltado ultimamente? Pouco depois, descobri que Lili Reinhardt é atriz de uma série de televisão americana para adolescentes e que o próprio livro é um bocado adolescente. Um Young Adult da Poesia. Existirá o género? Curiosamente, fez-me sentido que tivesse sido este o livro que escolhi (ou terá sido ele a escolher-me?) para me iniciar na poesia, como uma espécie de rito de passagem. E porque, ultimamente, me tenho sentido uma espécie de adolescente, com tanta vida e paixão a fervilhar em mim, e esta esperança renovada no amor, como se nele continuasse a ver a minha cura.

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Paralelos

Estou a ler vários livros ao mesmo tempo. Isto não me costuma acontecer; gosto de me concentrar num livro de cada vez. Mas calhou, nem me vou dar ao trabalho de explicar porquê, ter começado vários livros ao mesmo tempo; intercalo a leitura consoante o estado de espírito. Mas não deixa de ser estranho e confuso e dá-me vergonha de os pôr todos no Goodreads, não vão as pessoas pensar que perdi o juízo (eu acho que as pessoas que fazem o que eu tenho feito ultimamente são pouco centradas e meio esquizofrénicas).

Depois, hoje, que é sábado, mas trabalhei duas horas de manhã e duas horas de tarde, apercebi-me, duh, de que também estou a traduzir vários livros ao mesmo tempo, um de manhã, outro de tarde, e tenho outro já na calha. Vou intercalando consoante o número de páginas que me predisponho a fazer por dia e o avanço que dou; às vezes, também intercalo consoante o meu estado de espírito, porque um é uma sátira e os outros dois são de autoajuda. Por oposição, não acho isto nada estranho nem confuso.

 

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Enquanto espero

Fui vacinada. Já passaram 48 horas e já não me dói o braço, mas acometeu-me uma grande preguiça. Dormi como uma pedra, o que já de si é esquisito – eu ter uma noite sem percalços -, mas passei a manhã mole e cansada, como se não tivesse pregado olho. Agora, estou à espera que o estado evolua, que comece a ter dores no corpo, sintomas de gripe ou algo mais, porque eu sou aquela pessoa que, num jantar de grupo, toda a gente come do prato de comida estragada, mas só a ela é que lhe faz mal.

Não obstante o estado dormente, ontem à noite ainda deu para terminar O Fulgor Instável das Magnólias, da Ivone Mendes da Silva, e para, mesmo antes de adormecer, sentir aquele sentimento de vazio que me preenche quando termino um livro mesmo muito bom ou descubro um grande escritor. Já mandei vir os Contos Esquivos, mas vou adiar o prazer.

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Dia Mundial do Livro

A professora de Português da mais velha enviou um e-mail a desafiar os encarregados de educação a irem à sala falar sobre livros, incentivar à leitura ou, simplesmente, partilhar o gosto pela leitura. Na pré-escola ou no primeiro ciclo, eu seria pessoa para me alistar imediatamente. Não que adore estar em frente de um grupo de miúdos a fazer macacadas ou a tentar ser fixe, pelo contrário, mas as minhas filhas pediam-me recorrentemente que o fizesse e a verdade é que corria sempre bem e era muito bem recebida pelos miúdos, para quem é sempre uma excitação quando vem alguém de fora fazer qualquer coisa – não importa o quê.

Mas no 5.º ano a conversa é outra. Pôr-me à frente de 26 miúdos à beira da puberdade e, ainda por cima, de máscara, sem lhes conseguir interpretar as microexpressões, era coisa para me tirar o sono vários dias seguidos. Felizmente, a Inês arrumou o assunto rapidamente: Mãe, nem penses, morria de vergonha se fosses falar à minha turma.

Eu não lhe disse que quem morreria de vergonha era eu e fiz aquele ar de enfado fingido que as mães fazem quando não querem mostrar como estão aliviadas. De qualquer maneira, não sei do que poderia ir lá falar. Não poderia, certamente, ir dissertar sobre o último livro do Javier Marías que estou a ler, Não Mais Amores, uma coletânea de contos, dos quais, cito, ele não se envergonha (é bastante reconfortante ouvir um autor aclamado dizer que se envergonha de coisas que escreveu) ― e com o qual estou a aprender tudo o que se dizer num conto pequeno, de escrita simples e fluida ―, e sobre a sua obsessão pelo nome Luisa. Já tinha reparado que todas, ou muitas, das suas personagens femininas se chamam Luisa, mas nestes contos isso é realmente flagrante. Mas não há nada misterioso por detrás da escolha do nome, na verdade é enfadonhamente simples:

No hay más razón que esta: me siento cómodo, en las novelas, con pocos nombres de pila. Unos me parecen demasiado vulgares (como no llamarle nada al personaje), otros demasiado literarios o alambicados. Luisa es uno de los que me van bien, por eso lo utilizo en casi todas mis novelas. También Marta, por ejemplo. En mi vida personal no ha habido ninguna Luisa ni ninguna Marta de importancia para mí. No hay más, de verdad.

Acho isto delicioso. Mas duvido que miúdos do 5.º ano o fossem achar minimamente digno de nota.

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