Vermicompostagem para totós

Quem me lê sabe que, de vez em quando, escrevo sobre compostagem. Quem me lê também sabe também que, há umas semanas, ganhei umas minhocas vermelhas da Califórnia para acelerar o meu processo de compostagem. Desde então, tenho vindo a experimentar vários sistemas que me permitam fazer a compostagem na varanda com o máximo de rendimento e o mínimo de chatices possível. Comecei, sem minhocas, com uma caixa em cima de terra, no canteiro exterior. A compostagem sem minhocas tem de estar em contacto com a terra para que todos os bichinhos necessários à decomposição venham ajudar no processo. Era um sistema bastante rudimentar e, no princípio, andei no quintal à procura de minhocas e bichos-da-conta para povoar a minha caixa, mas cedo percebi que a natureza trabalha melhor do que eu e não era preciso nenhum esforço extra. Com os orifícios certos por baixo, para estar em contacto com a terra, e nos lados, para circular ar, e revolvendo a mistura de 3 em 3 dias, no máximo, em dois meses comecei a ver resultados. O único senão era o tamanho da caixa. Como era pequena, não dava vazão a todos os resíduos da nossa cozinha. Cozinhamos bastante e consumimos muitos legumes, vegetais e fruta e o objectivo de reduzir o desperdício não estava a ser cumprido. Felizmente, em Março recebi as minhocas, o que veio dar um boost à minha compostagem e me obrigou a arranjar um sistema mais elaborado.

A estrutura de vermicompostagem assenta, normalmente, em três caixas dispostas umas por cima das outras, formando três andares: o de cima, onde vamos colocando a matéria-prima (aka desperdícios da cozinha, borras de café, papel, etc.) que as minhocas vão decompondo. À medida que este andar vai ficando cheio e/ou decomposto, passamos o andar número um para baixo e começamos a encher o andar que agora está em cima. Em baixo está uma caixa que recebe o chorume, que é o líquido que se forma em todo este processo. O chorume é um biofertilizante natural que podemos usar para regar as plantas.

O esquema é este:

Um vermicompostor de compra é muito caro, por isso tentei encontrar alternativas mais baratas. Comprei um daqueles sistemas de arrumação de três gavetas que há a venda por 20 € e furei o fundo das gavetas 1 e 2. Coloquei a caixa na varanda, protegida do sol e da chuva por caniço.

Teria corrido bem, não fosse a qualidade das gavetas ser péssima e não vedar bem. Devido às várias frestas entre as gavetas e a estrutura, começou a encher-se de mosquitagem. De cada vez que abria a gaveta principal, tinha de abrir caminho por entre uma nuvem de insectos voadores que começaram também logo a pôr os seus ovinhos. Era urgente encontrar outra solução. Lembrei-me que a Alexandra da oficina de Hortas Verticais tinha dito que o seu vermicompostor consistia apenas em caixas de esferovite daquelas do peixe, que há nas peixarias e no mercado. Então fomos pedir dessas caixas à peixaria da qual somos clientes e arranjaram-nos algumas, que preparei e furei, como se segue, de acordo com o esquema anterior. Não é tão elaborado como este, mas o pressuposto e o aspecto são mais ou menos os mesmos. Fiz ainda o possível para afastar o maior número de mosquitos possível, e acho que, pelo menos por enquanto, mais mosquitos não entram. Quanto às minhocas, andam de boa saúde. Trouxe quinze e já conto umas vinte. Consta que as bichas se reproduzem bastante rápido, por isso não admira.

A cabeça é a parte mais próxima daquela parte mais gorda. E não, não me faz impressão alguma mexer nelas. Não saltam, nem voam, por isso até podia andar com uma de estimação ao ombro…

Seguem-se algumas fotos do processo. Espero não estar a fazer nada mal. Mas se as minhocas têm sobrevivido até agora, com boas condições para se reproduzirem, alguma coisa devo estar a fazer bem. Além disso, já consegui usar algum composto nos meus vasos, por isso: missão cumprida!

Publicidade à parte, foram estas as caixas de esferovite que arranjei na peixaria.

 

Fiz vários furos no fundo de duas das caixas. É muito fácil furar o esferovite com uma chave de fendas, por exemplo.

Os furos servem para as minhocas passarem de uma caixa para a outra à procura de comida, e também para o chorume escorrer para a caixa de base, por isso devem ser da grossura de um lápis.

Parecem 4 caixas, mas a de cima serve apenas como tampa –  a tampa é imprescindível para salvaguardar as minhocas de serem comidas por pássaros! Em cima, a estufa só para fazer peso. O esferovite não pesa nada e com o vento que faz aqui a tampa era bem capaz de voar e lá vinha o corvo Rafael às minhocas… A proteger o vermicompostor da chuva e do sol está caniço que comprei de propósito.

Espero que este esquema seja definitivo!

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Breve lição de ornitologia

A questão que se coloca agora é: o corvo é um corvo ou o corvo é uma gralha?

O tio João, versado em várias artes desde música a ornitologia, afirma a pés juntos que o corvo Rafael não é um corvo, não senhor, o Rafael é uma gralha, que vive no quintal de um tal Luís (é só ali ao lado) e costuma visitar vários quintais freguesia fora, onde lhe dão de comer. Ora, nunca me tinha passado pela cabeça que o corvo afinal fosse uma gralha. Podia ou não não saber que as gralhas são tão parecidas aos corvos. Na verdade, agora que, contra a minha vontade, me dediquei à ornitologia percebo que pouco sei sobre corvídeos. Ou pássaros, no geral. Por exemplo, aquilo que sempre me pareceram melros a sobrevoar o meu jardim são, afinal, gralhas-de-bico-vermelho. Numa pesquisa exaustiva e, agora, menos tendenciosa, percebi que, de facto, gralhas e corvos dificilmente se distinguem perante olhos desconhecedores. A ser verdade que se trate de uma gralha e não de um corvo, poderei voltar a sair à rua sem antes apurar o ouvido e inspeccionar todos os telhados das redondezas. Afinal, de ataques vingativos de gralhas não reza a História, só mesmo a língua portuguesa!

(O tio João também acha que os corvos não são nada sinal de mau presságio, mas que disparate, se até figuram na bandeira de Lisboa!)

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O corvo Rafael – A Perseguição 

Como já devem ter percebido pelo título, a coisa ficou feia. Uma inocente história de um corvo que dá pelo nome de Rafael e vai comer bolachas à mão do “dono” e que destrói sementeiras tomou proporções drásticas este fim de semana. Quer-me parecer que não vamos lá com meia dúzia de espantalhos acriançados, não…

A fotografia, tirada poucas horas antes do fatídico encontro, não mente: não estamos a falar de um melro! Estou em crer que nem mesmo de um corvo. Isto mais parece um peru, dizia a vizinha Ana, ou até mesmo um urubu! O bicho é gigante, especialmente quando corre para nós e abre as asas. Diz a Infopédia que chega a ter uma envergadura de asas de 120 cm, que é só menos 39 cm da minha altura, portanto fiz bem em correr pela vida!

Mas recuemos no tempo. Depois de um sábado a arrancar ervas daninhas (que a Bumba na Fofinha tão bem descreve), a cavar terra e a pôr terra nova, a plantar e a arranjar estratagemas (que incluem arruda, canela e ocupar os espaços livros com pedras, conchas e vasos) para manter os gatos longe do novo canteiro, fiquei deveras irritada quando vejo o corvo Rafael a rondar. Se de manhã só sobrevoou o sítio, à tarde já estava de patorras no empedrado, cada vez mais próximo da minha relíquia. Quando achei que era altura de mostrar quem manda, aproximei-me dele e chamei “Ó psst, ouve lá, não achas que está na altura de dares de frosques?” Como não fez caso de mim, e continuou a bicar as gerberas, aproximei-me mais e, de mão na anca, insisti: “Rafael, ninguém te quer aqui, baza!” Mas nada. Ou o bicho é mouco ou está a ignorar-me de propósito, pensei. Por via das dúvidas, e porque insisti que tinha de chamar o bicho à razão, fui buscar o regador-aspersor que uso para afastar os gatos sem lhes fazer mal. Aproximei-me do bicho e esguichei. Uma borrifadela. Nenhuma reacção. Duas borrifadelas. Ora bem.

Como é óbvio, eu não estava à espera do que aconteceu a seguir. Ligeiramente incomodado com as borrifadelas, o Rafael virou o bico para mim com desprezo e olhou-me bem nos olhos, e eu olhei bem nos seus olhos pretos e o que vi foi uma espécie de raiva hitchcockiana que me fez, inconscientemente, parar de borrifar e começar a dar passos cautelosos para trás. O Rafael, com nome de anjo mas olhos de demónio, virou-se então totalmente para mim e começou a andar, com passos de avestruz, na minha direcção.

Foi mais ou menos nesta altura que comecei aos gritos. Primeiro com voz sumida, mas quando percebi que aqueles passos eram só para tomar balanço e voar direito a mim, comecei a berrar de forma completamente descontrolada, enquanto corria – pela vida! Na única vez que olhei para trás, já o bicho estava no ar, de asas bem abertas (recordo: até 120 cm de envergadura de asas!), na direcção da minha cabeça! O Tiago, que assistiu a tudo pela janela da cozinha e cedo percebeu que os meus gritos não denunciavam apenas uma gafanhoto gigante, e me abriu a porta no último momento, antes de ser furiosamente arrebatada por um corvo em fúria (posso ou não estar a exagerar nesta parte), garantiu-me que tudo na postura do bicho prenunciava um ataque iminente. Também me disse, sem nunca tirar o ar de gozo na cara (…), que não se percebia bem, pelo meu gesticular que acompanhava os gritos, se o que eu queria era proteger a cabeça, se voar eu também dali para fora.

Agora que tudo passou, posso dizer que já dei umas boas gargalhadas à conta do incidente, mas na altura tive mais medo do que quando saltei para ver o tubarão-baleia. E tudo só porque levou com uns borrifos de água! Bicho mimado!

É claro que uma coisa destas fez com que passasse a noite obcecada a procurar informações sobre corvos e ataques de corvos, que parecem ser bem frequentes em países longínquos como a Austrália e o Canadá. Mas o que encontrei a seguir não me deixou nada descansada:

1 – Os corvos ficam ofendidos e guardam rancor. E tudo só porque levou com uns borrifos de água??
2 – Os corvos têm memória e não esquecem a cara de quem os ofendeu. Mau…
3 – Nem com máscara! Está cada vez melhor…
4 – Os corvos conspiram uns com os outros e podem trazer amigos para se vingarem. Vamos mudar de casa!
5 – Entre as coisas que vou ter de passar a fazer para me proteger do corvo que se vai lembrar de mim e da minha cara (mesmo com máscara) durante os próximos cinco anos está andar no quintal de guarda-chuva e ter sempre amendoins no bolso.

 

Tenho medo.

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