Nós os quatro

Este foi o ano em que deixei de ter filhas bebés. Ia dizer que não sei como isto se deu, mas é mentira. Tudo começou com o desfralde da Alice e a decisão da própria em dar as suas duzentas chuchas às gaivotas que um dia sobrevoaram a nossa casa, menos a chucha preferida que guardou para dar ao Pai Natal. Um dia, depois do cinema, viu o Pai Natal num centro comercial e quis ir dar-lhe a chucha. Previ noites horríveis de choro desalmado a implorar pela chucha, mas isso nunca aconteceu. Nunca, o que é mais uma prova de que os filhos nos surpreendem e têm mais força do que a que vemos neles, os nossos eternos bebés que vão precisar sempre da nossa ajuda e protecção. A mais velha, que entrou este ano na escola e desabrochou, já fez 6 anos. Com a idade chegam também as perguntas difíceis (sobre tornados e assim) e o entendimento de como funciona o mundo, como por exemplo, os Pais Natal dos centros comerciais são só avozinhos e se calhar até são os pais que nos compram as prendas (mais perguntas difíceis). Pergunta-nos ainda quando é que pode começar a ir sozinha para a escola para poder ter um telemóvel. Ai.

Entramos numa fase gira: a fase dos jogos de tabuleiro depois do jantar e das histórias que ela já quer ler sozinha. Cada vez se entretêm melhor as duas, cada vez gostam mais uma da outra mas, às vezes, também se picam e irritam. É normal, dir-me-ão vocês, e com direito que não tive irmãos. São diferentes, elas. Se a mais velha é mandona, a mais nova já não deixa que lhe façam farinha. E nós, que às vezes parecemos meros peões neste jogo de forças, temos de as ir deixando resolver os seus problemas sozinhas, mesmo que às vezes pareçam problemas sem fim nem solução. O fim do mundo. A calamidade.

Há uns tempos achei que ainda faltava alguém nas fotografias. Mas hoje em dia não estou tão certa. Talvez quando a mais nova me deixar de pedir colinho (“Eu quero a ti”) me volte a coragem que me tem faltado. Ou se calhar não é uma questão de coragem, mas só de vontade. Vou adiando o desejo de ter outro bebé, porque às vezes, penso mesmo que se melhorar, estraga. E vou deixando que esta decisão difícil escorra pelos dedos como areia da praia. Somos capazes de estar bem assim.

 

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